sábado, 11 de fevereiro de 2012

A Minha Semana com Marilyn, por Carlos Antunes


Título original: My Week with Marilyn
Realização: Simon Curtis
ArgumentoAdrian Hodges e Colin Clark
Elenco: Michelle Williams, Eddie Redmayne, Kenneth Branagh, Julia Ormond, Emma Watson e Toby Jones

Michelle Williams é uma Marilyn Monroe mais perfeita do que a original. Reprodução com as falhas apagadas e os traços mais desejáveis polidos.
Plasticamente não tem mácula, sem falhar um gesto, uma expressão ou um olhar, o que, para pesadelo dos puristas, virá a causar que no imaginário generalista esta reprodução substitua parcialmente o original.
Essa perfeição é um problema grave, embora tal pareça um contra-senso quando uma aparência fiel é motivo de notícia e rejubilo antecipado.
Esta Marilyn deveria ter falhas na sua beleza, imperfeições de carácter reflectidas em alguns dos momentos do seu quotidiano.
Tendo lido um livro que fale sobre ela - como este, que aborda o período mais lato em que a semana do título está incluída - a audiência interessada saberá que a insegurança quanto ao aspecto que apresenta diante dos outros levava a actriz a gastar várias horas a maquilhar-se antes sequer de aparecer diante de alguém.
Esse sinal evidente da dualidade identitária de uma mulher dividida entre Norma Jean e Marilyn Monroe está ausente do filme pois mesmo em cenas em que ela chora ou sucumbe aos efeitos dos fármacos, o seu aspecto não ultrapassa a barreira da beleza fragilizada que a mantém como inebriante figura para o protagonista e, sobretudo, o público.
Há um único e quase imperceptível momento em que essa fragilidade está à vista, quando Marilyn pergunta a Colin (o autor das memórias aqui adaptadas) "Devo interpretá-la?".
O resto do tempo é o mito que é apresentado e louvado. Não totalmente desprovido de mácula, mas com aquelas que tornaram o mito mais admirado.
Os comprimidos, a necessidade de aprovação, a incompreensão da sua vontade de se afirmar como actriz e a sua incapacidade de lidar com os traumas do seu passado. Todos eles problemas que se tornaram parte integrante da imagem que qualquer pessoa tem de Marilyn Monroe, por mais ténue que essa seja. E todos eles problemas cuja origem pode ser atribuída a outras pessoas ou às circunstâncias que a rodeavam, mas raramente àquela mulher que está ali a ser objecto de escrutínio.
O filme nada acrescenta à discussão sobre a mulher e o seu desrespeito pelos colegas de trabalho (enfantizado pela influência de Paula Strasberg) ou as suas escolhas movidas pelo seu próprio desejo.
Desejo tão simples de ver quando o filme levanta a pergunta sobre as razões de ela ter escolhido Colin (consciente que iria abandoná-lo depois) para ser o seu apoio quando foi Sybil Thorndike quem melhor a tratou e quem mais perto esteve de a compreender.
Michelle Williams fez uma transformação fantástica mas o argumento falha em dar-lhe algo de substancial com que esculpir uma personalidade para a personagem e o seu trabalho parece, pois, pouco mais rico do que o de um imitador que copia trejeitos e enfantiza manias.
O argumento conta com o conhecimento e a admiração que a personagem interpretada já tinha para justificar uma ridícula historieta de amor - como prova o outro lado do triângulo amoroso interpretado por Emma Watson - da qual Marilyn terá obtido um temporário consolo e da qual o jovem Colin terá saído com uma obsessão permanente.
Numa semana e com tão pouca idade, dificilmente Colin terá tido a capacidade para analisar Marilyn a fundo. E tendo escrito sobre a forma de diário não há uma estrutura narrativa definida.
Nenhum desses dois problemas são resolvidos na passagem a filme e é difícil aceitarmos que a interpretação de Michelle Williams terá de bastar para tornar este filme relevante.
Sobretudo quando, logo por detrás da obsessão da câmara com ela, estão as interpretações fantásticas de Judi Dench e Kenneth Branagh ou a reconstituição quase palpável de um modo de fazer cinema que já não existe.


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