sábado, 18 de agosto de 2012

Três Vezes 20 Anos, por Carlos Antunes


Título original: Late Bloomers
Realização: Julie Gravas
Argumento: Julie Gravas e Olivier Dazat
Elenco: William Hurt, Isabella Rossellini e Doreen Mantle
Editora: Zon Audiovisuais

A velhice não se atrasa para ninguém, apenas a consciência de que ela chegou varia de pessoa para pessoa.
Quando Mary (Isabella Rossellini) se apercebe de que o momento chegou ela atira-se ao facto com a lucidez mórbida que a tecnologia emprestou ao mundo, comprando barras para se segurar na banheira e telefones de teclas grandes para não ter de recorrer aos óculos.
Quando confronta o marido com a idade que chegou, Adam (William Hurt) reage com a crise de meia-idade que tardou, logo após receber um prémio de arquitectura que parece dizer que a parte importante da sua carreira está terminada. Recusa continuar o projecto de revolucionar os lares de repouso e junta-se aos jovens da empresa no desenho de um museu. Daí até começar a vestir-se como eles é um passo.
O que parece poder vir a ser uma comédia romântica de desencontros de mentalidade numa idade que os outros não pensam já ser o de fortes emoções amorosas sofre um desvio, apesar do envolvimento do casal com elementos mais novos, ele casualmente chegando ao ponto de ser a figura tutelar que faz mais do que inspirar a rapariga que para ele trabalhar e ela encontrando o interesse no olhar de um homem que não acha que a beleza desaparece apenas porque a idade passa.
Na verdade o drama desinibido que se instala e que é pacificado por um ou outro sorriso – devido à idade dos protagonistas e à confusão que esta poderá criar no público que só pretende ver corpos jovens e belo – fala da passagem à terceira idade e do que ela guarda a dois níveis: o de actividade e o de sexualidade.
Por motivos mais ou menos correctos, que começam como uma birra contra o desprezo que a idade merece dos mais novos e acabam como provas da sua disponibilidade, ambos os elementos do casal acabarão por se entregar a actividades com um certo grau de risco relativamente às vidas que levaram.
Provam que mais do que “ainda” terem algo a dar, têm algo mais a dar. Não como um último fôlego, mas um novo fôlego que os mais jovens nunca aprendem a ter.
Sexualmente as suas vidas demonstram um realismo ainda maior, aproveitando o filme para deixar a dúvida sobre o verdadeiro sucesso que ambos possam ter tido com os seus parceiros mais novos.
A história abre e fecha, literalmente, com Hurt e Rossellini em apaixonadas cenas de cama. Sexo bem sucedido e feliz que, se no início é a causa das primeiras aflições – uma perda de memória afecta Mary na manhã seguinte – é, também, a grande solução final.
No sexo a idade torna-se um constrangimento que suscita o engenho. E a sabedoria neste campo parece ser um elemento benéfico contra o frenesim físico. 
Tudo isto abordado com a elevação que dois actores estupendos dão a um filme que não chega a ser tão bom quanto eles são mas que se dispõem a deixar-se conduzir pelo que eles naturalmente trazem ao argumento.
William Hurt cultiva uma sobriedade que quase o faz desvanecer perante os nossos olhares mas que é uma das grandes interpretações do ano. Como seu par e seu oposto, Isabella Rossellini irradia a beleza credível da idade que passa mas não pesa e resplandece pela qualidade da sua interpretação.
Eles levam o filme para momentos de concretização – veja-se a cena do diálogo de gestos e expressões que têm na festa de lançamento do filho – que são assombrosos.
São eles, também, que dão o tom nuclear ao filme que além dos toques suaves de comédia se diverte também com o politicamente incorrecto, em cenas que nem sempre parecem dever fazer parte da montagem final, seja a avô de Mary a dizer “que se lixem” os seus bisnetos (um futuro “suit” e uma futura “slut” segundo ela) pois tem direito ao seu descanso depois dos filhos e dos netos de que tomou conta ou o amigo de Adam que se atira a todas as mulheres mas que confessa nem poder tomar Viagra por causa do seu pacemaker.
O título português parece, apesar da sua diferença para o original, ter acerto devidamente no que nos diz o filme. Estes personagens, como estes actores, que constituem o par principal têm três vezes mais vida para mostrar do que os casais novos que vivem os seus dramas no grande ecrã.



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