quinta-feira, 20 de setembro de 2012

V/H/S, por Carlos Antunes


Título original: V/H/S
Realização: Ti WestDavid BrucknerGlenn McQuaidJoe SwanbergAdam Wingard e Radio Silence
Argumento: Ti West,Simon BarrettMatt Bettinelli-OlpinDavid BrucknerTyler GillettJustin MartinezGlenn McQuaidRadio SilenceNicholas Tecosky e Chad Villella
Elenco: Calvin ReederLane HughesHannah FiermanSophia TakalDrew Moerlein e John Walcutt

Acho que o conceito abstracto do filme é muito bom: uma colecção de cassetes em que foram captadas os mais variados momentos de terror verídicos e que se aproximassem do conceito de snuff.
Gostaria de ver essa ideia aplicada a um filme simples sobre dois coleccionadores tentando superar-se mutuamente, em elementos de colecção e em sustos. Ou sobre a cultura de um clube de vídeo underground.
No fundo, algo que sublinhasse o voyeurismo sádico a roçar a indiferença humana, que é o sentimento que o filme como um todo deveria sugerir ao público se este chegasse a embrenhar-se por completo nele.
A maneira como colocaram uns quantos tipos a invadir uma casa - e a filmarem-se a fazê-lo, num grau de estupidez humana sempre surpreendente, apesar de realista - para roubar uma dessas cassetes é um modo muito simples de adicionar mais uma curta de horror ao conjunto e evitar criar algo sólido para agregar a antologia de cassetes mostradas depois.
Entre as cassetes dentro da cassete - algo que, considerando o que foi expresso no parágrafo anterior, não merece uma análise de lógica de composição - a selecção é muito pobre e confirma, vez após vez, o quanto o found footage é um esquema ao serviço de quem não tem imaginação para mais.
Há duas curtas (Amateur Night e 10/31/98) exactamente iguais em que um tipo com uma câmara montada nos óculos/na máscara da cabeça sai com um bando de outros gajos (tendencialmente energúmenos bêbados) para acabar numa casa com uma mulher que parece ser a vítima e acaba tornada em predadora. Que uma seja vampira e outra esteja possuída são pormenores de somenos.
Noutra das curtas (Tuesday the 17th), um grupo de amigos vai para a floresta para ser morto por um sujeito que incorpora o mal e que é infilmável. O uso da cassete (será que a captura directa em DVD ou película mudava alguma coisa?) parece resumir-se a essa esperteza de tornar o mal mais abstracto, mas visto que toda a ideia da curta é velha, não há como não concluir que o realizador não tinha imaginação para o mal que devia representar.
Outra ainda (The Sick Thing That Happened to Emily When She Was Younger) parece um derivado de Paranormal Activity usando uma ideia vaga de mistério e um video chat como falsas inovações. Facilmente se pode considerar a última imagem deste segmento como o seu resumo eloquente: um par de mamas e um "I wasn't saying anything.".
Só mesmo Second Honeymoon - não por acaso realizada por Ti West que já este ano tinha deixado excelente impressão com The Innkeepers - mostra que há cinema nesta antologia.
Filmando uma viagem que antes de ser de terror é uma história a dois (depois, a três), Ti West foi o único a capturar o espírito sincero do que seria um snuff.
O seu uso das imagens registadas na primeira pessoa rege-se pela lógica e não pelo efeito. Quem filma não precisa de rever de imediato a cassete, continua sempre a filmar adiante.
Por isso a intervenção de um elemento estranho permanece um mistério para as personagens e para o público.
Uma figura estranha cuja invasão do espaço alheio se rege por uma ideia semelhante, aproveitar a câmara para filmar porque está disponível e porque ninguém resiste à tentação de registar os momentos mais indevidos sem os quais estas cassetes não existiriam.
Este segmento acaba com uma pergunta que mostra o grau de consciência do próprio aparato da câmara empunhada pelas personagens: "Apagaste as imagens?".
Ti West, com elementos tão simples, reflectiu sobre a própria natureza do found footage ligado à natureza humana de cedência à tentação. O medo está em imaginar todos os registos que se conservam por cremos que eles nunca chegarão a mais ninguém.
É para Ti West que vai uma estrela nesta classificação, assinalando o seu trabalho no seio da restante pobreza. Dou mais meia estrela à ideia inicial. O resto é corrido a zeros.



Sem comentários:

Enviar um comentário