quarta-feira, 17 de julho de 2013

Semana em Crítica - 11 de Julho

A Batalha de Tabatô (2013), de 


Ficção encenada, "contaminada" pelo documentário em quase todo o tempo, na segunda longa-metragem de João Viana persiste a ideia da paz através da música, mesmo quando o seu protagonista é afectado pelos dramas passados da guerra. Espécie de metáfora da situação da Guiné-Bissau, reflecte sobre o nosso passado colonial, mas é sobretudo a forma como revela uma cidade perdida onde todos os seus habitantes são músicas, que mais curiosidade traz. Daí que talvez o foco da curta-metragem documental Tabatô (a partir da qual construiu este filme) seja mais preciso que este. Destaca-se o manuseio virtuoso da câmara de Viana. Uma estrelaUma estrelaUma estrela Tiago Ramos

Uma batalha de objectos e dos seus sons pela memória que ficará de um país, A Batalha de Tabatô é primeiro um trabalho de paixão - e de paixões para aqueles que viveram e vivem a Guiné-Bissau - e depois um trabalho de realização. Partilha várias características com Ó Marquês, anda cá abaixo outra vez!, mas a maior delas é essa da urgência de registar para depois imaginar maneiras de lhe acrescentar o infilmável. Um filme que se constrói perante o público à medida que acontece: João Viana é um caçador de acasos cinematográficos que ele próprio dinamiza. Uma estrelaUma estrelaUma estrela Carlos Antunes



No Nevoeiro (2012), de Sergei Loznitsa


Tal como Lore (2012), também este No Nevoeiro recupera os eventos da II Guerra Mundial, reencenando-os de um ponto de vista diferente. Neste caso, a ocupação alemã à Bielorrússia, em 1942, sob o olhar da câmara de Loznitsa, repleto de planos-sequências e uma visão que privilegia o silêncio das personagens e do espaço. Intrincada tragédia pessoal e humana, o nevoeiro do título não é só físico. Metáfora do estado ambíguo das personagens, entre traição, culpa e inocência, temos aqui um dos melhores trabalhos de realização do ano. Uma estrelaUma estrelaUma estrela½ Tiago Ramos



Assassinos de Férias (2012), de Ben Wheatley


Eis uma comédia negra inclemente com a estratificação social britância e mais inclemente ainda com os pensamentos sociopatas (senão mesmo psicopatas) que todos têm e que alguns ainda disfarçam. Sem mais nada do que um par de personagens comuns e uma meada de situações hilariantes, os três autores (os protagonistas e o realizador) seguem numa demanda de boas intenções e maus fígados. Rir durante as mortes torna-se um predicado do filme que o público descartará no final da sessão para não ser obrigado a reconhecer o quanto se irritou e comoveu com este casal que cumpriu as suas próprias fantasias. Uma estrelaUma estrelaUma estrelaUma estrela Carlos Antunes

Já tinha surpreendido com Kill List (2011), um dos melhores filmes que estrearam o ano passado nos cinemas portugueses, mas o britânico Ben Wheatley regressa agora num registo distinto. Porém, a brutalidade de Kill List está também presente neste Assassinos de Férias - título que desvenda logo o mote da trama - num tom de humor negro como há muito não se via no cinema. Uma espécie de história de amor macabra, com um argumento exímio na construção desse tom irónico e visceral, pelas mãos dos seus também protagonistas: Alice Lowe e Steve Oram. Visual e emocionalmente provocador, é uma das comédias mais inteligentes dos últimos anos. Uma estrelaUma estrelaUma estrela½ Tiago Ramos



Paixão (2012), de Brian De Palma


Brian De Palma regressa aos terrenos psicóticos a que nos habituou, num thriller psicoerótico repleto de rebuscadas mudanças narrativas. Construído com uma clara divisão de tom, não deixa de ser curioso como é na primeira parte da história - a mais distinta quando em comparação com a habitual filmografia do cineasta - que este se mexe melhor. Pela forma como constrói as personagens, num registo em fogo lento, especialmente a de Rachel McAdams, a esbanjar uma pose de femme fatale, num crescendo de diabolismo, é aqui que o filme mais tem a ganhar. Na sua segunda parte, quando entramos num terreno de psicoses e reviravoltas - muito "palmianas" - é aí que incrivelmente o argumento mais derrapa. Confusão previsível, mas bizarra, apresenta muita comédia involuntária, que nem a dupla Rapace e McAdams consegue salvar. Uma estrelaUma estrelaUma estrela Tiago Ramos

Não deixa de ser certo que Passion é um thriller psicológico erotizado (a exploração do beijo das protagonistas foi exagerada) com alguns temas recorrentes de De Palma. Mas também vale a pena reparar como De Palma evita cada vez mais repetir-se a citar Hitchcock para congregar um leque mais alargado de citações, até mais propícias ao país onde filma. Entre traços estéticos do Expressionismo Alemão e influências narrativas dos gialli, Passion exige e oferece um pouco mais ao espectador do que uma visão rasante permitirá perceber. Até porque De Palma pode ter muitos defeitos, mas sempre trabalhou obsessivamente os detalhes dos seus filmes e este não é excepção. Uma estrelaUma estrelaUma estrela Carlos Antunes



Depois da Terra (2013), de M. Night Shyamalan


Não será um filme a merecer rasgados elogios pela sua qualidade, nem que atraia o público contra os maiores "espectáculos" de efeitos especiais que estreiam nesta altura. Mas trata-se de um trabalho sólido, combinando o interessante controlo dramático de uma história que conjuga a sobrevivência solitária com a recuperação da relação entre pai e filho e a inteligente reinterpretação do futuro de acordo com ideias mais ligadas à ecologia. É a alternativa - até por não ser um blockbuster - no seio dos esforços pouco sólidos de fantasia e ficção científica que continuarão a encher o Verão. Uma estrelaUma estrelaUma estrela Carlos Antunes

Repleto de toques shyamalianos (campos/contracampos e o tema do medo subjacente à história principal, por exemplo), mas demasiado preso a uma história previsível e banal que tenta explorar uma relação pai e filho ao género de Spielberg, sem sucesso. Falha sobretudo na forma como estrutura a narrativa à semelhança de um videojogo e à forma como se prende à figura de Jaden Smith, mais forçada que talentosa, numa espécie de cópia de Will Smith, sem qualquer graça ou carisma. Uma estrela Tiago Ramos



My Way (2012), de Florent-Emilio Siri


Biografia da (improvável) estrela pop francesa, Claude François, My Way discorre a sua história de vida, numa forma praticamente exaustiva. Aí padece o principal problema do filme: são demasiadas histórias secundárias e demasiados eventos, que apenas distraem do essencial e tornam o filme cansativo. A assumir a sua biografia completa, a história beneficiava em muito num formato de minissérie. Jérémie Renier constrói uma personagem incrivelmente próxima da figura real de Claude François, num interpretação distinta, embora não consiga convencer quando se tenta passar por um jovem de 22 anos. Quanto à história, destaca-se na fase inicial quando a acção se passa no Egipto, mas depois não consegue manter o mesmo registo, entrando muitas vezes num tom muito próximo do mau gosto que nem sempre sabemos distinguir se é de Claude François e da sua época ou se do realizador Florent-Emilio SiriUma estrelaUma estrela½ Tiago Ramos



A Vida em Oranges (2011), de Julian Farino


Há uma conclusão no filme, a de que ninguém leva a vida como quer ou como deve até que o passa a fazer. No entanto não há um método para essa transformação - uns ficam sozinhos, outros tomam mais atenção a quem já está com eles - mas convém que ela seja motivada por uma situação clara de destruição das relações anteriormente em vigor... apenas para que elas voltem a resultar embora em pontos diferentes de evolução. Se o objectivo do filme era mostrar que os subúrbios da classe média-alta americana são um universo à parte, prefiro ver um qualquer episódio de Desperate Housewives e saber que fico melhor servido. Uma estrela Carlos Antunes

A prova em como um elenco talentoso não consegue sustentar um mau argumento está em A Vida de Oranges. Tenta criar uma sátira suburbana que nem sempre suporta, especialmente por subaproveitar os seus actores (especialmente Catherine Keener, Allison Janney e Oliver Platt) e criar um desenvolvimento superficial das suas personagens. É simpático, mas completamente inofensivo - embora elogiável como não se perde muito com rodeios na sua fase inicial - sendo que teria muito mais a ganhar se não tentasse ser um American Beauty dos anos 2010. Uma estrelaUma estrela Tiago Ramos



Amor à Prova de Roubo (2011), de Rob Minkoff


Amor à Prova de Roubo podia ser engenhoso na forma como subverte as regras do típico heist movie, mas prefere adicionar uma enorme confusão de personagens e reviravoltas, para disfarçar uma originalidade que não tem. Tem os seus momentos divertidos, mas não tem nem um décimo da inteligência que quer fazer crer. Pontos por tentar fazer regressar o género whodunit à la Agatha Christie - pena que não o consiga fazer. Uma estrela½ Tiago Ramos

Não cabem todos os géneros num mesmo filme a menos que eles sejam utensílios anónimos ao serviço da composição dramática das personagens. Depois dão-se casos como estes em que as reviravoltas só acrescem ao absurdo de tentar juntar um detective de dedução com uma comédia de exageros durante um assalto a um banco com um (de início) homícido em paralelo. Tudo para disfarçar que isto é apenas uma comédia romântica como se adivinhava do facto de apenas duas personagens surgirem com um "bom aspecto excessivo" num filme de grupo onde os estereótipos nem sequer combinam uns com os outros. Uma estrela Carlos Antunes



Forças Especiais (2011), de Stéphane Rybojad


Quando entre a televisão americana e britânica a qualidade das séries de drama militar se eleva já muito acima do que o próprio cinema tem mostrado, é estranho que de França chegue um filme que faz retroceder o estilo das cenas de acção de umas "Forças Especiais" ao heroísmo inconsciente e individualista de peito aberto às balas. Considerando que a história parece pertencer a um filme de sobrevivência em condições difícieis, faz ainda menos sentido o aparato de Forças Especiais que só sabe ir buscar diálogos estereotipados - "Eu fico para trás e aguento-os" ou "Prometi à tua mulher que te levava para casa vivo, pois vais ser pai." - para fazer as vezes de drama. Uma estrela½ Carlos Antunes

Se há coisa que este Forças Especiais prova é que nem só de Hollywood chegam thrillers de acção e guerra desprovidos de qualquer emoção ou personalidade. Produção francesa, totalmente genérica, tenta homenagear uma figura e acontecimentos reais, mas nem a presença de Diane Kruger e Dijimon Hounsou consegue salvá-la da sua inocuidade. Uma estrela½ Tiago Ramos



Jovens Deliquentes (2012), de Ron Scalpello


Prejudica-se a si próprio por não querer focar a sua acção exclusivamente no espaço fechado de uma prisão (lembramo-nos assim de repente do muito bom Celda 211), preferindo explicar os motivos do seu protagonista através de previsíveis flashbacks que o fazem entrar no domínio do thiller. Porém, surpreende pela forma violenta e poderosa com que explora a narrativa, com uma excelente interpretação de um jovem Joe Cole. Beneficiaria muito mais se se assumisse como o filme de vingança que é nas entrelinhas, enclausurado pelas barras das celas, que teima frequentemente em escapar. Uma estrelaUma estrelaUma estrela Tiago Ramos

O problema de filmes como este é o seu receio em admitir que é um culto visual da violência e nada mais. O drama do protagonista e a sua vida (pouco) difícil dentro da prisão servem apenas para tentar conferir um elemento de sobriedade a um esquemático retrato social da violência que se tivesse tido origem nos EUA da década de 1980 estava hoje esquecido excepto pelos cultores de filmes abaixo de série B. Uma estrela½ Carlos Antunes 

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