quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Semana em Crítica - 1 de Agosto

A Gaiola Dourada (2013), de Ruben Alves


Uma das mais interessantes comédias dos últimos tempos, também porque tem o forte valor sentimental de ter como protagonistas um casal de emigrantes portugueses em França. Mas à parte disso, é uma daquelas felizes ocasiões onde os clichés e lugares-comuns são usados em favor da narrativa, elevando-os a um tom singular, partindo do estereótipo colectivo para as individualidades. Com uma realização elegante e valores de produção bastante competentes (brilhante fotografia, montagem, direcção artística e banda sonora), equilibra-se entre comédia e drama, com um tom sentimental e atento. Divertido e inteligente, sabe aproveitar o seu elenco (especialmente a fabulosa Rita Blanco) em seu favor, trazendo um filme que comunica directamente com o seu público. Uma estrelaUma estrelaUma estrelaUma estrela Tiago Ramos

Não tenho dúvidas que estamos perante uma comédia popular que facilmente divertirá até o mais renitente do público. Comédia de costumes em composição grupal que agora se dirá de tradição francesa porque em Portugal já são poucos os que não se envergonham por ela deambular - António-Pedro Vasconcelos deve ser a excepção da última meia dúzia de anos. Os seus valores de produção são de uma dignidade inexcedível, acrescentado dos talentos portugueses - Rita Blanco à cabeça - e franceses - Chantal Lauby acima de qualquer outro intérprete do filme - para dar dignidade a uma série de estereótipos assumidos por conhecimento e comoção pessoal do realizador. Eles dão uma imagem por demais desditosa de parte a parte, reforçando uma limitação cultural que os personagens não parecem interessados em superar (ao contrário do modelo similar visto em Os Encantos do 6º andar). Mais ainda inseridos numa trama que coloca os estereótipos como elementos de identidade que vingaram para levar a que sejam as personagens a mostrarem-se vingativas (e/ou mesquinhas) para no final voltarem a ser adoráveis, sem exigências de avaliação pessoal. Homenagem divertida mas tristemente limitada a uma pequenez de que ninguém escapa, como se fosse esse o fado, não só dos portugueses em França mas igualmente dos que com eles interagem. Ter depois Catarina Wallenstein (porque não uma fadista das recentes gerações?) a cantar um fado de Amália parece a inclusão de um ícone falso como símbolo de um país que será belo na sua tradição sofrida. Uma estrelaUma estrela Carlos Antunes



Um Homem de Família (2012), de Ariel Vromen


The Iceman é a interpretação de Michael Shannon. À sua volta o argumento não se esforça particularmente por definir uma vida de abordagem - parte filme de gangster, parte filme de assassino escondido na normalidade familiar, parte retrato social em torno dos assassinatos -, mas funciona bem ao retratar abrangentemente o quotidiano de um assassino contratado usando as técnicas narrativas necessárias - duas vidas em paralelo a caminho de colidirem no momento menos oportuno - sem tentar definir a psicologia ou a moralidade do homem. Essa é a tarefa executada por Shannon, encarnando um homem de família tornado "psicopata" pelas circunstâncias, no silêncio solitário com que ocupa o ecrã. É um misto de ânsia e sofrimento que mantém o público afastado da figura apresentada ao mesmo tempo que lhe entrega uma esperança de sucesso. Shannon leva ao máximo o seu talento em momentos como aquele em que Richard Kuklinski tem de se aliar a outro assassino para controlar a raiva que começa a afectar a família e continuar a fazer dinheiro para a sustentar, funcionam como a indestrinçável aliança do homem comum a lidar com problemas e pulsões e do homem censurável a todos os níveis, deixando o público ainda mais a sós com as suas emoções desconcertantes. Uma estrelaUma estrelaUma estrela Carlos Antunes



Hóspedes Indesejados (2011), de Ti West


Ti West firmou-se como um dos mais interessantes jovens  realizadores do género, mesmo se olharmos para Hóspedes Indesejados como um produto de difícil catalogação. Move-se para além do simples género de terror (apesar de usar as fórmulas clássicas), sobretudo porque manipula o espectador e utiliza os sustos ironicamente, desenvolvendo um crescendo de ansiedade e temor, que raras vezes se concretiza em algo palpável. É por isso mais que um exercício de estilo, mas um produto inteligente e raro dentro do género, capaz de surpreender o espectador (mesmo sem grandes "surpresas" e artimanhas). Uma estrelaUma estrelaUma estrela½ Tiago Ramos

Ti West é realizador que usa o terror como uma ferramenta mais na narrativa definidora das personagens e do seu contexto, por vezes em nome de um comentário à realidade social que é inevitável e não imposto - a prová-lo está, igualmente, o seu segmento em V/H/S. Sem essa limitação de ter de "fazer género", Ti West constrói filmes que se querem ver e que se podem rever, não estando dependentes de truques ou de surpresas, mas com a história e as personagens no centro de tudo.  Uma estrelaUma estrelaUma estrela½ Carlos Antunes



Phantom - O Submarino Fantasma (2012), de Todd Robinson


As histórias de submarinos armados com poder nuclear dependentes de decisões individuais são frequentes e regulares - ainda há pouco tempo a SIC passava uma série com uma premissa muito similar a esta. O que faz com que este valha a pena, malgrado o seu final alegórico a propósito do nome do filme/equipamento, é a maneira como equilibra intrigas palacianas russas e planos extraordinários a propósito da Guerra Fria com uma tensão eficaz mesmo perante resultados predefinidos. Limitado ao lado russo, o filme faz um retrato perspicaz de uma potência em dificuldades mas com talentos políticos e tecnológicos para causar danos ao mundo e sair vitoriosa de uma guerra que nunca travaria. Que tal plano digno de vilões mais extravagantes possa ter sido realidade é ainda mais interessante, mostrando que não há rival ficcional para a realidade.
Ed Harris é o actor de destaque aqui, mas até seria melhor que não o fosse, dado que funcionaria melhor como figura funcional a par de todas as outras em vez de ter de carregar um passado dramático que num filme deste nunca chega a ser significativo. Uma estrelaUma estrelaUma estrela Carlos Antunes

Tentando recuperar um sub-género já praticamente fora de moda (onde títulos como The Hunt for Red October, Crimson Tide ou K-19: The Widowmaker saltam à vista), Phantom - O Submarino Fantasma não consegue evitar comparações. Especialmente porque é um produto menor comparativamente com os já referidos, que não se consegue em momento algum libertar dos clichés do género, apesar de tentar seguir um estilo melodramático, que explora bastante bem a atmosfera clássica e tensa. Ed Harris e William Fichtner conseguem trazer alguma humanidade às suas personagens, apesar das claras limitações das mesmas. O desfecho é óbvio (isto porque a narrativa é baseada em factos verídicos e todos sabemos o que aconteceu), pelo que diminui em grande escala a tensão que o filme vem preparando ao longo do tempo. Não é necessariamente o produto que é mau, mas é principalmente porque traz um tom antiquado, num sub-género que não soube envelhecer. Uma estrelaUma estrela½ Tiago Ramos

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