domingo, 1 de dezembro de 2013

Semana em Crítica - 14 de Novembro

Vénus de Vison (2013), de Roman Polanski


Cineasta obsessivo e incrivelmente inteligente na forma como conduz o seu trabalho, Roman Polanski consegue mais uma vez capitalizar o poder do espaço numa narrativa neste Vénus de Vison, como já tinha feito recentemente em The Ghost Writer (2010) e Carnage (2011). Aqui assume um lado ainda mais teatral, iniciando um complexo e satírico jogo de espelhos, com uma peça de teatro, dentro de uma peça de teatro, dentro de um filme. Sob o olhar atento e cuidado do cineasta, o filme multiplica os seus simbolismos para fora da tela, com as inúmeras ligações que o espectador poderá fazer à vida pessoal do realizador (curiosa ainda a presença da sua esposa na vida real, Emmanuelle Seigner, como protagonista, numa soberba interpretação. Um filme em constante mutação que peca apenas pelo seu final moralista e forçado. Uma estrelaUma estrelaUma estrelaUma estrela½ Tiago Ramos

La Vénus à la fourrure segue-se a Carnage como aprofundamento das hipóteses ainda inexploradas da mise en scène, por via do teatro - neste caso, pelo espaço de encenação para além do texto de origem. Um filme que assume pela imagem a comunhão entre a realidade e a ficção e o papel que o observador tem nos "resultados" de ambos - o que, por extensão, fala da manipulação/criação. Um trabalho de máscaras em mutação que falam da profundidade da alma humana, pelo sexo como sintoma da instabilidade emocional (e pessoal) submetida a um controlo racional (e colectiva). Uma estrelaUma estrelaUma estrelaUma estrelaUma estrela Carlos Antunes



A Mentira de Armstrong (2013), de Alex Gibney


Uma obra documental que parecia vir a ser uma história sobre a intimidade de Lance Armstrong e que, pelas circunstâncias surgidas a meio da sua pós-produção, se transformou num dos documentos de maior acesso a um desenrolar de acontecimentos que acabariam por marcar a consciência da época. Um documentário acidental quanto à forma final, mas bem conduzido a partir do momento em que ganha consciência da falsidade do seu próprio fascínio com o ciclista. Fica como um retrato das ilusões mediáticas do mundo actual e de como os desejos da multidão por um herói acabam por o transformar numa figura vilanesca repleta de um poder dado por quem com ele foi conivente. Uma estrelaUma estrelaUma estrela½ Carlos Antunes



Any Day Now: Talvez Um Dia (2012), de Travis Fine


De uma história verídica (e importantíssima de recordar pelo seu valor social) parte-se aqui para um filme que perde pela forma pouco subtil como propagandeia a sua intenção. Por mais honrosos que sejam os temas que aborda, a forma como por vezes se torna um estandarte demasiado evidente, prejudica a subtileza e delicadeza de uma história incrivelmente poderosa. A culpa será muita do realizador que não evita os maneirismos do telefilme, mas que felizmente é em grande parte suplantada pelo soberbo trabalho de interpretação, especialmente Alan Cumming num dos melhores papéis da sua carreira e também deste ano comercial. Uma estrelaUma estrelaUma estrela Tiago Ramos

A relevância do tema do filme ainda se mantém actual pelo que, mesmo inconscientemente, este tem uma militância social apontada ao Presente. A situação da história na década de 1970 descansará algumas consciências e a qualidade da mesma agitará quase todas as sensibilidades. Arriscando tratar várias das nuances do caso em questão, do preconceito homofóbico à impreparação social para lidar com casos de crianças com deficiências cognitivas, todas elas unidas na acção judicial de adopção por parte de um casal homossexual manipulada na sua imparcialidade. Além do próprio controlo do argumento que nunca se sujeita ao melodrama barato, também a realização e a interpretação de Alan Cumming (sem menorizar Garret Dillahunt e Isaac Leyva) colaboram para a coesão do filme. A primeira é competente mas corre riscos com os momentos musicais que conseguem acrescentar informação emocional às personagens. A segunda é madura, assume o protagonismo que lhe compete mas sem espalhafato, antes acolhendo os elementos à sua volta, o que a torna uma das melhores a ver este ano. Uma estrelaUma estrelaUma estrela½ Carlos Antunes



Malavita (2013), de Luc Besson


Luc Besson foi um cineasta significativo antes de decidir ser o ideário de um cinema americano nado em França. Da curiosidade que alguns desses títulos mereciam por terem uma origem "exótica" passou-se a uma visão de apreço pela diferenciação que os temas desses filmes tinham mesmo dentro do cinema de géneros mais populares. Continuamos nesse estado de apreço perante uma comédia sobre a Máfia capaz de trazer De Niro para protagonista em citação directa (e saudosista) a Goodfellas e de levar Michelle Pfeiffer a brincar com o seu próprio estatuto de estrela glamorosa. Dá ideia de que Luc Besson foi o único a estar atento ao excelente resultado que os dois actores tinham alcançado em Stardust. Com os dois actores dispostos a darem de si ao filme e tornando a família mafiosa mais Addams do que Sopranos, Besson fez do filme algo totalmente despretensioso - outra maneira de dizer entretido. Tão obviamente divertido como é excessivo, recorre a fórmulas mais óbvias que compensa com tantas outras ideias originais capaz de o tornar melhor do que seria se tivesse origem apenas em Hollywood. Uma estrelaUma estrelaUma estrela Carlos Antunes

Como realizador, Luc Besson é um dos poucos que ainda consegue oscilar entre géneros cinematográficos distintos de uma forma coerente e inteligente, apresentando na sua maioria trabalhos que mesmo não sendo brilhantes, conseguem deliciar o espectador. Malavita beneficia porque potencia em muito o poder da escolha do seu elenco: Michelle Pfeiffer e Robert De Niro a liderar, mas o restante elenco familiar não deixa a desejar. Divertido e capaz de entreter, o filme trabalha bem o material original, mas ao colar-se em demasia a essa estrutura, por vezes mais episódica, perde alguma da coesão ideal. Simultaneamente drama e comédia familiar, assim como thriller de acção, Malavita é entretenimento simples, mas capaz.  Uma estrelaUma estrela½ Tiago Ramos



O Verão da Minha Vida (2013), de Nat Faxon e Jim Rash


As histórias de juventude desajustada que, com o Verão, encontra acolhimento num lugar tão desajustado quanto ela parecem-se cada vez mais entre si. Mas The Way Way Back parece ainda mais uma recuperação de outros filmes por se ir passar num parque (aquático), o que logo lembra Adventureland (pelas óbvias semelhanças de premissa) bem como um largo número de outros filmes que vêm sendo feitos desde a década de 1980. Algo potenciado ainda por ter Sam Rockwell (em forma) num papel mais pateta - logo, menos irónico - do que fez em Choke onde também trabalhava num parque em que o passado estava preservado numa figuração do seu comportamento de rejeição à responsabilidade adulta. O resto do filme é um conjunto generalizado de personagens discretamente desajustadas e aparentemente cool envolvidas em relações adultas que murcham enquanto as relações jovens desabrocham. O filme pode definir-se todo assim, meio por meio, com uma visão algo deprimente mas ainda assim esperançosa do que vai ser a vida do(s) seu(s) protagonista(s). Tirando o talento acrescido, não há algo que este filme venha acrescentar ao género, e mesmo nesse domínio o curioso é ver Steve Carrell num papel oposto ao habitual de socialmente atrapalhado. Uma estrelaUma estrela Carlos Antunes

Nat Faxon e Jim Rash já tinham mostrado em The Descendants (2011) que eram capazes de trabalhar uma história familiar de um modo consistente, mesmo que repleta de lugares comuns. Em O Verão da Minha Vida conseguem repetir a mesma fórmula, mas dando-lhe um toque mais cómico e um tom familiar que permeou muitos dos filmes da década de 90. Ainda que as história sejam comuns e de certo modo banais, entre o vasto rol de personagens e narrativas há uma coesão e coerência bastante significativas, com destaque para Sam Rockwell, Steve Carell e a pequena descoberta de Liam James (que já tínhamos visto, por exemplo, na série The Killing). Ainda assim e apesar de ser bastante secundária, a interpretação de Allison Janney num lado mais cómico do filme, é suficiente para comprovar o enorme talento desta actriz que merecia ainda mais destaque no cinema contemporâneo. Um filme amoroso e delicioso na sua simplicidade. Uma estrelaUma estrelaUma estrelaUma estrela Tiago Ramos



Thor: O Martelo dos Deuses (2011), de Óskar Jónasson, Toby Genkel e Gunnar Karlsson


Um grau de benevolência tem de estar associada a qualquer crítica ao primeiro filme de animação digital saído da Islândia. Isto porque há uma variabilidade muito grande na qualidade da animação, deficiente quanto aos movimento, formas e expressões dos personagens mas esforçada quanto ao cenário. Já no que toca à história há riscos que se nota que os criadores correram na alteração da mitologia Nórdica para se enquadrar num modelo cómico com alguma influência do moldado pela Dreamworks mas, e sobretudo, da banda desenhada Franco-Belga. Não é satisfatório e a sua estreia só se compreende perante a do filme da Marvel, mas merece alguma simpatia. Uma estrelaUma estrela Carlos Antunes

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