quinta-feira, 15 de fevereiro de 2018

O Paradoxo Cloverfield, por Eduardo Antunes

https://splitscreen-blog.blogspot.com/2018/02/o-paradoxo-cloverfield-por-eduardo.html

Título original: The Cloverfield Paradox (2018)
RealizaçãoJulius Onah
ArgumentoOren UzielDoug Jung

A grande pergunta com que saímos da visualização de The Cloverfield Paradox é se, em qualquer circunstância, poderiam a mera promessa de atar as pontas soltas de um franchise que ninguém pediu, e a falta de pagamento de uma taxa de entrada numa sala de cinema, ser suficientes para valer o esforço de gastar o nosso tempo num tal empreendimento sem qualquer recompensa.

Por vezes, é irónico ver como o título do filme pode falar mais criticamente sobre este do que os seus criadores esperavam. Neste caso, pois esta narrativa é um paradoxo em si mesma. Não pelas peripécias para as quais as personagens são atiradas, mas pela falta de identidade que é gerada sobre o próprio filme, pela quantidade de géneros e pontos narrativos que tenta jogar. E, tal como se veio a saber já de 10 Cloverfield Lane, essa situação deve-se ao facto de se ter aproveitado um argumento já escrito para um filme original para encaixar numa série de filmes que desde há uma década, ninguém quis realmente ouvir falar novamente, tenham ou não gostado do original Cloverfield.

Ainda assim, 10 Cloverfield Lane teve sorte, pois a parte dedicada ao elemento de ficção científica estava remetido a duas cenas finais que, ainda que meio forçadas, traziam um elemento final de mistério sem explicações desnecessárias, a uma estória bem definida nas suas personagens, estrutura e suspense.
O problema aqui é que, talvez no processo de restruturação deste argumento que certamente terá acontecido, aquilo que podia ser um filme à semelhança de Alien ou mesmo Life (estreado no ano transacto), puro thriller envolvendo um elemento que ultrapassa os limites da compreensão das personagens, acaba por nem sequer tentar ter elementos novos suficientemente desenvolvidos para justificar a sua existência.

Isto nota-se logo desde o início em que, à parte da personagem principal interpretada por Mbatha-Raw, nenhuma outra personagem recebe qualquer tipo de apresentação. Se mesmo em Life a estória rapidamente era posta em movimento, deixando ainda espaço para interacções entre personagens, aqui, quando entramos dentro da estação que será o palco da acção em (quase) todo o filme, nem existem interacções entre as personagens antes de sermos apresentados ao conflito do filme.
E se isto não fosse suficiente para demonstrar a preguiça de uma escrita que nem sequer tenta dar personalidade a qualquer um dos sete restantes protagonistas, nem razões ou objectivos para qualquer um deles estar ali (nem sequer sabemos ao certo a especialização de cada um deles), o facto de nunca nos serem explicadas as regras do que se está a passar (aparte de brevíssimas referências a múltiplas realidades/dimensões) não ajuda a sairmos do estado de confusão face ao que se passa e concentrar-nos mais na acção.


Piorando isto, está o facto de nenhuma personagem sequer se comportar como um humano face a situações estranhas; ao encontrar uma pessoa completamente desconhecida dentro de uma parede da estação ou aquando da perda de um apêndice de um colega (e subsequente ganho de consciência do mesmo), as reacções que nos são oferecidas pelas personagens são de pura apatia, como se estas regras do jogo fossem já conhecidas, apesar de serem tratadas como momentos de surpresa e suspense. É quase como se nem os próprios actores e actrizes soubessem como reagir ao seu papel neste filme.
No meio de algumas cenas visualmente interessantes e falta de estrutura, existem ainda cenas em que acompanhamos a jornada do marido da protagonista na Terra, pelo meio de uma guerra meramente contextualizada numa crise energética (tentando ainda pôr uma mensagem de forma imérita), que no final não levam a nada senão à revelação (sem qualquer sentido ou impacto) do monstro original de Cloverfield, que em nada se deve aos restantes eventos do filme.

O final do filme é tão forçado para arranjar uma (completamente desnecessária) ligação para o primeiro filme que se denota ainda mais o que deverá ter sido a decisão de última hora de associar este filme a Cloverfield. Aliás, a existência deste filme como parte deste inaparente franchise, é efectivamente um paradoxo, visto que no final as perguntas ainda são mais. Se o primeiro filme surgiu da ideia simples de inserir num filme de monstros uma forma contemporânea e (àquela época) pouco usada de contar estórias cinematográficas, e a "sequela" trazia uma dimensão dramática e isolada ao produto final, este traz toda uma dimensão inapropriada e, no final, pouco original. Felizmente para a audiência que tenha curiosidade neste filme, não terão que gastar o dinheiro ou esforço de se deslocarem a um cinema para "apreciar" isto.



2 comentários:

  1. Estou tão desiludido por isto estrear apenas na Netflix e não nos cinemas. Eu estava a contar ir vê-lo ao cinema quando estreasse e agora isto. Eu tenho os dois primeiros em DVD e se isto for só para a Netflix não vão lançar em DVD o que me vai estragar a “coleção” pois tenho os dois primeiros originais.

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  2. O Paradoxo Cloverfield é assumidamente uma nova direção sobre o próprio universo, mas nada que realmente dê créditos a uma nova concepção. Amei ver no elenco a Elizabeth Debicki, ela é uma atriz preciosa que geralmente triunfa nos seus filmes. Recém a vi em O Conto, um dos melhores filmes de terror, sendo sincera eu acho que a sua atuação é extraordinário, em minha opinião é a atriz mais completa da sua geração, mas infelizmente não é reconhecida como se deve.

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