sexta-feira, 16 de março de 2018

Tomb Raider: O Começo, por Eduardo Antunes


Título original: Tomb Raider (2018)
RealizaçãoRoar Uthaug

Se Assassin's Creed nos provou alguma coisa há dois anos é que, independentemente da equipa e valores de produção, filmes baseados em videojogos tendem a não saber adaptar os pontos fortes das respectivas histórias ao grande ecrã. E Tomb Raider volta a confirmá-lo, apesar do que as aparências pudessem dar a atender.

Desde há algum tempo que considero injusto comparar filmes quando baseados em outros meios ao seu material base, seja ele livro ou outro, não só porque diferentes meios devem contar histórias de diferentes formas, como muitas vezes se deve reconhecer outras potencialidades que o meio cinematográfico pode trazer a uma história previamente contada.
Mas apesar disso, sendo fã dos videojogos recentes de Tomb Raider em que este filme se inspira, não posso deixar de aproveitar o meu conhecimento dos jogos, não para simplesmente apontar as diferenças entre o filme e jogo, mas para demonstrar como deixa escapar o potencial que este tem.

Logo à partida, a fórmula vencedora dos jogos de plataformas desta heroína começaram a demonstrar um pouco a falta de ideias novas, pelo que em 2013 foi decidido recomeçar do zero de forma a revitalizar a famosa série de videojogos, tentando chamar novo público, com uma Lara Croft mais ajustada ao tempos modernos, com maior dramatismo e mecânicas renovadas.
Esta decisão levou à criação de um jogo que, mais do que meramente um jogo de acção e exploração, é um jogo de sobrevivência, em que acompanhamos a jornada da nossa protagonista antes de se tornar a heroína titular, numa jornada de crescimento pessoal de Lara Croft em que se vê forçada a aprender a sobreviver sem qualquer prévia preparação.
Isto faz com que acompanhemos Lara desde um estado inicial totalmente vulnerável, passando pela sua primeira "matança" que a deixa em pânico, enquanto vai crescendo até no final se tornar capaz de fazer o necessário para sobreviver pelos seus próprios meios.

Esta situação faz com que o filme seja um produto algo irónico, visto que, ao contrário de combater a fatiga dum género de filmes com o mesmo tipo de lógicas e sequências e adaptar a história de sobrevivência referida, na tentativa de se destacar como algo mais original, é apenas mais um filme de acção. Ainda para mais, junta a história dos dois jogos mais recentes da personagem, ao invés de ser um filme mais focado e não tentar aliciar já as pessoas para possíveis sequelas.





Aliás, em retrospectiva, a história deste filme é igual à do primeiro filme com Angelina Jolie, apesar de o tentar dissimular. Uma organização secreta procura um poder antigo, descoberta na qual a nossa protagonista se tenta adiantar, acabando a organização por se aproveitar dos conhecimentos de Lara para os ajudar a resolver os enigmas que permitirão abrir esse poder, e cuja descoberta permite no final a reconciliação de Lara com o seu pai e com a perda dele. Tudo se sente demasiado familiar.
A única diferença deste filme é a aparência de um maior dramatismo (para o qual a presença de Alicia Vikander contribui, apesar de não ter muito com que trabalhar) e os maiores valores de produção, que apenas tentam desviar as atenções do mesmo tipo de lugares comuns, que aqui já apresentam pouca lógica. Veja-se o facto do objectivo do túmulo procurado ser que ninguém saia nem entre do mesmo, não fazendo portanto qualquer sentido que tenham construído uma porta capaz de ser facilmente aberta a quem souber interpretar os seus símbolos.

E apesar do esforço do primeiro acto em nos apresentar Lara no "mundo real", essa apresentação em nada acrescenta à personagem que vemos seguidamente na ilha, tirando o facto de sabermos que ela sabe kickboxing (ainda que a vejamos perder numa de já muitas sessões, para depois, enquanto na ilha, vencer sempre).
Existe, inclusivamente, uma perseguição em bicicleta que, apesar de estimulante enquanto sequência de acção, não acrescenta rigorosamente nada, quer à personagem, quer à narrativa posterior do filme. Por alguma razão o jogo em que o filme se baseia se focava meramente no pano de fundo da ilha, não apresentando os eventos anteriores ao naufrágio, deixando-nos ao invés descobrir através de conversas com os restantes membros da tripulação naufragados os eventos que os levaram ali.

Tudo isto serve apenas para demonstrar que estes filmes continuam sem saber aproveitar o potencial oferecido pelas histórias presentes nos jogos que pretendem adaptar ao grande ecrã. Jogos estes cujas narrativas até cada vez mais se tentam aproximar da qualidade de argumentos cinematográficos. Ao invés, preferem adaptar momentos específicos dos jogos para agradar aos fãs que os reconheçam, e aliciar estes com sequelas que poderão nunca acontecer. Se houve algo que este filme me fez sentir, foi a vontade de revisitar um jogo capaz de me fazer apaixonar por uma personagem tão complexa e vulnerável quanto heróica, à qual o filme não faz de todo jus.


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